terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O Início

Janeiro de 1999: Três biólogos decidem viajar de bicicleta pelo litoral do Nordeste levando uma exposição itinerante sobre o Pantanal
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Daniel De Granville, Guto Bertagnolli e Tietta Pivatto
chegando em Jericoacoara, CE (29 de julho de 1999)


Quando se fala em ciclismo, todo mundo logo pensa naquelas competições envolvendo um monte de gente suada correndo em cima de uma bicicleta com um número grudado na camiseta. Porém, segundo o Dicionário Aurélio, ciclismo é "a arte de andar de bicicleta". Assim, chegamos à conclusão de que nós três éramos ciclistas havia muito tempo e não sabíamos.

Tudo bem, então já éramos ciclistas, mas daqueles de fim de semana, que durante sua vida toda vai pedalar uns três mil quilômetros no máximo. Daí a inventar um projeto de pedalar quase 4.500 quilômetros em quatro meses tem uma grande diferença!


O Começo De Tudo
Na primeira vez que tivemos essa idéia, nem nós acreditávamos muito que íamos levá-la a sério. Mas a coisa foi tomando forma, começamos a imaginar o que seria viajar tudo isto, e também queríamos "algo mais", pois com um pouco de pesquisa descobrimos que ir de bicicleta de Vitória a São Luís não era algo tão inédito assim... Ouvimos falar de gente que estava dando a volta na América do Sul, outros indo do Alaska à Terra do Fogo, outros ainda apenas dando a volta no planeta! Assim surgiu o Projeto "Pantanal Vai à Praia", uma maneira de agradecer ao Pantanal e os Pantaneiros por tudo que ele nos mostraram, conhecer o Nordeste e ainda conseguir quem nos patrocinasse pelo ineditismo da coisa.

Idéias prontas na cabeça, por onde começar a agir? Ainda estávamos no Pantanal - trabalhando no Refúgio Ecológico Caiman -, não tinhamos muito tempo, e o único computador e telefone à nossa disposição eram os de serviço. Assim, nos raros momentos em que não estavam sendo usados, a gente digitava o Projeto pra buscar patrocínio ou fazia os primeiros telefonemas.

E o treinamento?
Era feito nas horas vagas, ou seja, das 11 ao meio dia, debaixo daquele sol "ameno" do Pantanal em janeiro (quem conhece sabe muito bem a sensação). Pedalávamos 8 quilômetros em uma estrada cascalhada, parávamos em um corixo para um mergulho na água morna, voltávamos e chegávamos no refeitório para almoçar com nossos colegas de trabalho. Imagine a felicidade deles ao compartilharem uma mesa com três ciclistas suados... Algumas tardes sobrava um tempinho e lá íamos nós novamente, desta vez 28 quilômetros, com direito ao pôr-do-sol e bichos do Pantanal. Tudo cronometrado e anotado: velocidades máxima e média, tempo, distância percorrida. Parada pra descanso, só quando aparecia um tamanduá no mato ou quando um jacaré atravessado na estrada não dava passagem...

Assim se foi um mês, daí era hora de arrumar a mudança, despedir dos amigos do Pantanal e voltar para nossas respectivas cidades. O trabalho por lá havia terminado, e nos próximos três meses era dedicação exclusiva ao Projeto: mandar e-mails, correspondências, fazer centenas de telefonemas, montar a página na Internet, pedir patrocínio, treinar, arrumar mudança, estudar sobre a região que íamos percorrer e também sobre manutenção de bicicleta.


"É Erva Mate, Seu Guarda!"
O primeiro patrocinador que fechou com a gente - ainda no Pantanal - foi a Zaionc Agropecuária, uma fábrica de erva mate para tereré (versão pantaneira do chimarrão gaúcho, porém gelado por motivos óbvios!). Ganhamos um fardo com 30 pacotes de 500 gramas, que seriam levados na viagem para servir aos povos do litoral, e deveriam ser retirados por nós na distribuidora em Campo Grande, no dia de irmos embora. Imagine Daniel e Guto em uma Saveiro absolutamente lotada de tranqueiras (afinal, estávamos de mudança!), tendo de arrumar espaço para acomodar 15 quilos de tereré. A solução foi abrir o fardo e espalhar os pacotes da erva por todo o carro, onde tivesse um cantinho para enfiar - debaixo do banco, no porta luvas, na caçamba. É claro que o carro ficou impregnado com cheiro de erva mate, e é claro também que fomos parados por uma blitz da Polícia Rodoviária Federal à 1 hora da manhã no meio de Mato Grosso do Sul. Foi bem complicado convencer o guarda de que aquilo era erva mate, que estávamos sendo patrocinados e o tereré seria levado pelo Nordeste de bicicleta...


A Viagem
Foram três longos e trabalhosos meses, da chegada em casa no final de janeiro até a partida para Vitória no dia 5 de abril. Por definição, biólogos são extremamente idealistas e péssimos negociantes! Demorou até a gente pegar os macetes e ficar mais "cara de pau" para pedir patrocínio... Hoje podemos dizer que o mais cansativo em um projeto como este não é pedalar - definitivamente não! Nada se compara à correria para enviar as cópias do projeto às empresas, cobrar respostas, fazer cálculos, etc, etc.

Nosso roteiro foi montado com base em quatro fontes: um mapa rodoviário geral do Brasil, um guia de estradas e praias específico para o litoral, os mapas oficiais dos DERs de cada estado (nem sempre atualizados!) e um guia rodoviário em CD ROM da GFMI Software. Problemas? Em vários trechos, as informações não batiam entre as quatro fontes. Às vezes uma estrada não aparecia, ou as distâncias indicadas variavam 20 quilômetros. Pra quem está viajando de carro não é nada, mas de bicicleta...

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